O Presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, tem bloqueado seguidores que o criticam nas redes sociais, violando a liberdade de expressão e os direitos de acesso à informação e de participar do debate público, disse hoje a Human Rights Watch (HRW). É de crer que o DIP (Departamento de Informação e Propaganda) do MPLA esteja a equacionar importar para Angola a estratégia de Bolsonaro.
A organização não-governamental (ONG) internacional de defesa dos direitos humanos informou em comunicado que identificou 176 contas bloqueadas pelo Presidente, a grande maioria na rede social Twitter, incluindo jornalistas, congressistas, influenciadores com mais de um milhão de seguidores e cidadãos.
Além disso, a ONG identificou o bloqueio de contas de órgãos de comunicação social e de organizações não-governamentais. O número total de bloqueios é provavelmente muito maior.
“O Presidente Bolsonaro usa as suas redes sociais como um importante meio de comunicação pública e de interacção com a população”, disse Maria Laura Canineu, directora da HRW no Brasil.
“Mas ele está tentando a eliminar das suas contas pessoas e instituições que dele discordam para transformá-las em espaços onde apenas aplausos são permitidos. É parte de um esforço mais amplo para silenciar ou marginalizar os críticos”, acrescentou.
A ONG frisou que as pessoas bloqueadas precisam de sair das suas contas nas redes sociais para ver as publicações de Bolsonaro, dificultando o acesso directo a informações do Governo e não podem interagir com as publicações do Presidente, seja “repostando”, respondendo, gostando ou comentando.
“Isso impede que pessoas bloqueadas participem do debate público, viola a liberdade de expressão e discrimina-as com base nas suas opiniões”, salientou a Human Rights Watch.
“Jornalistas bloqueados não podem fazer perguntas ou solicitar informações, infringindo a liberdade de imprensa”, acrescentou a ONG.
A organização solicitou por meio de pedidos de acesso segundo a lei de informação os dados sobre as pessoas bloqueadas pelo governante brasileiro, mas a Secretaria de Comunicação da Presidência negou a informação, argumentando que não gere essas contas.
“A determinação de que contas de autoridades do Governo em redes sociais são privadas não deveria depender de quem as gerencia, mas sim se são ou não usadas para compartilhar informações ou discutir assuntos de interesse público”, disse a HRW.
O Presidente brasileiro tem quase sete milhões de seguidores no Twitter, 14 milhões no Facebook e mais de 18 milhões no Instagram e geralmente utiliza as suas redes sociais para fazer anúncios oficiais, para atacar os seus adversários políticos e para comentar sobre relações exteriores, como, por exemplo, quando parabenizou o novo primeiro-ministro israelita pela sua eleição.
Jair Bolsonaro também responde a comentários de cidadãos sobre diversos assuntos, desde vacinas contra a Covid-19 a nomeações políticas.
A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) também realizou um levantamento e identificou 135 repórteres bloqueados por autoridades do Governo brasileiro, a maioria pelo Presidente Bolsonaro. É possível que alguns jornalistas constem no levantamento das duas instituições.
A ONG também fez pedidos de acesso à informação sobre o número de pessoas bloqueadas por membros do gabinete do Presidente Bolsonaro. O ministro da Cidadania e o ministro da Casa Civil disseram que não bloquearam ninguém, enquanto o vice-presidente Hamilton Mourão informou que bloqueou 28 pessoas, apenas no Twitter.
Os outros ministros recusaram-se a fornecer informações, dizendo que não tinham contas ou que estas eram privadas.
A Secretaria de Comunicação da Presidência da República e os ministérios disseram ter bloqueado 182 pessoas nas contas institucionais. Os ministérios da Educação e da Justiça respondem por 85% dos bloqueios.
A HRW frisou ainda que enquanto bloqueava órgãos de imprensa e críticos nas suas redes, Bolsonaro reclamava que as plataformas de rede social excluíram as suas publicações ou de seus seguidores, alegando que são “cerceados” nas redes sociais.
“O Presidente Bolsonaro afirma que a liberdade de expressão dele e de seus seguidores é cerceada quando as plataformas excluem desinformação prejudicial e contas falsas, mas ele mesmo não pensa duas vezes antes de violar o direito ao acesso à informação e a liberdade de expressão das pessoas que discordam dele”, concluiu Maria Laura Canineu.
Redes sociais azucrinam ditadores
De acordo com um estudo, cerca de 40% da população mundial utiliza com frequência as redes sociais e, caso não exista a devida moderação, alguns especialistas afirmam que essa prática pode originar problemas a nível mental e comportamental, como stress, ansiedade ou depressão.
Uma pesquisa do Instituto de Psicologia Aplicada de Portugal sublinhou mesmo essa realidade ao revelar que mais de 70% dos jovens portugueses, até aos 25 anos, revela dependência da Internet. É assim decisivo estar a par das eventuais consequências do uso indevido das redes sociais assim como saber o que fazer para optar por alternativas saudáveis de socialização.
É incontornável que a Internet e, em particular, as redes sociais, permitem uma maior e mais democrática possibilidade de comunicação. Parte da rotina de muitos, essa prática fez nascer formas virtuais de relacionamento e gestão de tempo.
E quando se perde o sentido de moderação, podemos estar perante um quadro aditivo que levará a consequentes problemas nas relações pessoais, saúde e contacto com o mundo real.
Algumas pesquisas sublinham mesmo estados de dependência que derivam desse comportamento e respectivos sintomas psicológicos de abstinência.
O fenómeno das redes sociais é ainda muito recente, mas já foram feitas várias pesquisas sobre a sua influência no comportamento dos utilizadores. O principal alvo de observação tem sido o Facebook e as conclusões sobre o uso indevido desta nova forma de comunicação virtual trazem à tona distúrbios psicocomportamentais.
João Lourenço, líder do MPLA, partido no poder em Angola desde 1975, pediu/exigiu no dia 29 de Março de 2019 que sejam tomadas medidas contra dirigentes, governantes ou deputados que tenham um comportamento reprovável nas redes sociais. Uau! O Presidente abria fogo em várias direcções, mostrando que a melhor defesa é o ataque… mesmo que seja do tipo batalha do Cuito Cuanavale.
João Lourenço, que discursava na VII sessão do Comité Central do MPLA, referia-se “a pronunciamentos e outros comportamentos públicos reprováveis nas redes sociais e não só, por parte de militantes, dirigentes e deputados”, que, considerou, “em nada dignificam” o partido.
Isto, é claro, para além de não respeitarem as (suas) ordens superiores que, como se sabe, defendem a liberdade de opinião desde que esta, obviamente, seja igual à do chefe.
Para João Lourenço, o partido não pode continuar “impávido e sereno” perante tais pronunciamentos, apelando aos órgãos do MPLA que, no quadro dos estatutos, tomem uma posição. Ou seja, todos devem manifestar as ideias e os pensamentos veiculados pelo Departamento de Informação (e Propaganda) do Comité Central do MPLA.
O chefe de Estado e presidente da maior organização política de Angola frisou que foi lançada e promovida uma campanha a nível nacional de recuperação dos valores morais e cívicos da sociedade, por ter sido reconhecido uma acentuada queda desses ideais nos últimos anos. Daí a necessidade de blindar a “Educação Patriótica do MPLA” como condição ”sine qua non” para se ser angolano de… primeira.
De acordo com João Lourenço, o partido deve liderar esta campanha pela força do exemplo dos seus militantes, sejam eles mentirosos compulsivos quando falam da suposta vitória na batalha do Cuito Cuanavale ou criminosos cobardes quando abordam a questão dos massacres do 27 de Maio de 1977.
O também chefe de Estado realçou que o país está mais aberto, e esta mudança de comportamento reflecte-se também no seio do partido, uma vez que os “militantes são, em primeiro lugar, cidadãos que integram esta mesma sociedade angolana”.
E que tal exonerar as redes sociais?
O Governo (do MPLA) e os cidadãos (do MPLA) devem formar um grande pacto de convivência saudável no domínio das redes sociais, defendeu o então ministro da Comunicação Social, João Melo. “É preciso formas consistentes de lutarmos por objectivos consistentes”, destacou o governante, numa mensagem alusiva ao Dia das Redes Sociais.
Na mensagem, João Melo afirmou que as redes sociais são actualmente uma vida paralela das pessoas, na medida em que mais do que uma forma de socialização globalizada elas “são um parâmetro e um termómetro para tomada de decisões”.
“Não há dúvida de que as redes sociais devolveram nas mais variadas sociedades o exercício da cidadania, o que deve ser celebrado, dada a importância do debate para o exercício pleno da democracia”, escreveu o ex-ministro da Comunicação Social.
João Melo reconheceu, no entanto, que “nem tudo pode ser considerado positivo”, pois a rede social que informa e aproxima as pessoas é a mesma que amplia a disseminação de mentiras, boatos, pornografia e faz a apologia ao crime.
Na sua mensagem, o governante conclui que as redes sociais devem ser entendidas como um convite ao diálogo, sem fronteiras, com grupos pequenos ou para multidões.
Nesta nova realidade, sublinhou João Melo, somente a comunicação de via dupla terá êxito. Por isso, a maior lição das redes sociais é, antes de falar, “aprender a escutar”, ouvir o outro, conhecer as tendências e ter o discernimento do certo e do errado para a tomada de decisão.
Embora com uma maquilhagem diferente, a intenção deste, como dos anteriores, governos do MPLA é controlar as redes sociais, onde diz ser “questionado” e “ridicularizado”.
João Melo vestia na altura a pele de cordeiro (que até lhe ficava muito bem) mas, na verdade, o que ele e o governo que integrou pretendem é o mesmo que é defendido, embora de forma mais boçal, pelo general Bento dos Santos Kangamba, para quem a internet não mais deve ser usada para criticar as autoridades do país.
“Continuo a vos dizer que a internet veio, é aquilo que o presidente disse, a internet veio para as pessoas estudar, para investigar, melhorar o comportamento do seu estudo e aprender. Não é para entrar na vida das pessoas,” afirmou Kangamba.
O MPLA (que continua a entender que Angola é o MPA e o MPLA é Angola) sustenta agora, nomeadamente com a ajuda da sua sucursal para controlo dos jornalistas (ERCA) que o partido e o executivo (são uma e a mesma coisa) têm vindo a ser “questionados” e “ridicularizados” nas redes sociais, reavivando a controversa temática do controlo das redes sociais pelo poder.
Folha 8 com Lusa